China Afirma a Sua Posição

China Afirma a Sua Posição no Sector Energético da America Latina O Que Significa Para a Região, os EUA e Pequim

China Afirma a Sua Posição no Se c tor Ener gé tico da America Latina O Que Signi ca Para a Região, os EUA e Pequim

Programa Energia e Sustentabilidade

Foreword

in Latin American Energy: What It Means for the Region, the U.S. and Beijing

China Aposta na Energia da América Latina connections in LAC. China is furnishing countries across LAC with some of the world’s most advanced technology – solar and wind power systems – at highly competitive prices, thus gaining an edge on other international competitors. China Afirma a Sua Posição no Sector Energético da A erica Latina O Que Signi ca Para a Região, os EUA e Pequim e are pleased to present the Institute of the Americas Energy & Sustainability program’s latest report: China Stakes Its Claim in Latin American Energy: What It Means for the Region,

Prefácio

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emos o prazer de apresentar o mais recente relatório do programa Energia e Sustentabili- dade do Instituto das Américas: China Afirma a sua Posição no Setor Energético da América Latina: O que significa para a Região, os EUA e Pequim. A República Popular da China (China) tornou-se um grande investidor, credor e ator em todo o setor de energético na América Latina e no Caribe (ALC). Com efeito, os empréstimos e os investimentos da China financiaram um conjunto impressionante de projetos no domínio das infraestruturas, da energia e da exploração mineira. Com mais de US$ 58 bilhões investidos entre 2000 e 2019, a China tem claramente, como o nosso relatório demonstra, se afirmado no setor energético da ALC. Com os contornos da transição energética global e uma maior atenção à redução das emissões e à ação climática que estimula o enorme crescimento da energia renovável, a China mostrou a sua força nesse segmento do setor energético global e na ALC. O nosso relatório procura ressaltar um desenvolvimen- to muito significativo para a ALC e os Estados Unidos: o controlo da China e a posição dominante nos minerais críticos, nas energias renováveis e nas redes elétricas tem vindo a acelarar nos últimos anos. Tal como acontece com o aspeto mais matizado e contemporâneo do avanço da China em energias renováveis e minerais críticos, o alcance do gigante asiático na ALC tem, ultimamente, sido canalizado através de grandes aquisições e projetos ganhos em licitação internacional. Em 2020, as fusões e aquisições chinesas em energia da ALC atingiram US$7,7 bilhões, de acordo com a Bloomberg, ou 25% das aquisições chinesas. The People’s Republic of China (China) has become a major investor, lender and actor across the energy sector in Latin America and the Caribbean (LAC). Indeed, loans array of projects in infrastructure, energy and mining. With more than $58 billion invested between 2000 and 2019, China has clearly, as our report title notes, staked a claim in LAC’s en rgy sector. With th c ntours of the global energy ransi i n and incre sed attention on reducing emissions d climate action spurring huge growth in renew bleen rgy, China energy sector and in LAC. development for LAC and the United States: China’s control and dominant position in critical minerals, renew- able energy and electric networks have accelerated in the last few years. As with the more nuanced and contemporary aspect of China’s push into renewables and critical minerals, the Asian giant’s reach into LAC of late has been channeled through major acquisitions and projects won in interna- tional bidding. In 2020, Chinese M&A deals in LAC energy reached $7.7 billion, according to Bloomberg, or 25% of Chinese acquisitio s worldwide. From renewabl s auctions in Col bia and acquisition of takeovers of ajor transmission nd distribution compa- nies in Brazil and Chile, our report unpa ks th s new and the U.S. and Beijing.

Desde de leilões de energias renováveis na Colômbia e aquisição da maior empresa privada de energia renovável do México, até aquisições de grandes empresas de transmissão e distribuição no Brasil e no Chile, nosso relatório desvenda esta nova e menos conhecida faceta de conexões econômicas e financeiras da China na ALC. A China está a fornecer aos países da ALC algumas das tecnologias mais avançadas do mundo - sistemas de energia solar e eólica - a preços altamente competitivos, ganhando assim uma vantagem sobre outros concor- rentes internacionais. Como o maior consumidor mundial de petróleo, os esforços da China para garantir o abastecimento em mercados-chave como a Venezuela, Equador e Brasil também são notáveis. Os enormes empréstimos e investimentos da China na zona petrolífera e os acordos com as companhias petrolíferas nacionais (NOC) destes países têm sido bem documentados. Mais recentemente, uma grande descoberta de petróleo na costa de Guiana contou com uma NOC chinesa como parte do consórcio, sublinhando o interesse contínuo da China em projetos- chave de petróleo. O chamado elemento de armadilha da dívida da ALC é discutido no nosso relatório, dando particular atenção ao fornecimento de somas desconhecidas pelo governo chinês em financiamentos não oficiais para a região. O impacto da covid-19 na economia e no deficit orçamental da maioria dos países da ALC só irá acentuar este problema. O nosso relatório termina com informações destinadas a moldar a discussão dentro da administração Biden e nas maiorias democráticas em ambas as câmaras do Congresso. É um momento propício para reiniciar. De fato, a nova administração tem a oportunidade de fortalecer as relações EUA-América. secure supplies in key markets such as Venezuela, Ecuador and Brazil are also noteworthy. China’s enormous loans and investments in the oil patch and deals with the national oil companies (NOC) of these nations have been well-documented. More recently, a Chinese NOC as part of the consortium, underscoring China’s continued interest in key oil projects. LAC’s so-called debt trap element is discussed in our report, particularly with a no to the relevance of the Chinese government’s supply of unknown sums in LAC will only acce tu te this issue. discussion for the Biden administration and Democratic majorities in both houses of Congress. It is a moment that is ripe for reset. Indeed, the new administration has an opportunity to strengthen US-Latin America relations by encouraging private investment, particularly in mining, clean energy and infrastructure projects. The report assesses how the Biden administration can deal with the challenge of China’s growing reach in the economies of LAC and its often unfair trade and invest- ment practices. As it moves beyond the Trump adminis- tration’s relations across the Western Hemisphere, we highlight theneed for the new Biden administration to respond to China’s expanding role in LAC’s energy sector, including recent ergers and acquisition (M&A), nd ways to ad ress ome of he geopolitical conse-qu ces of the e investments.

IMAGE DE CAPA Yuan chinês no mapa da América do Sul Fonte: Alamy

Em toda a América Latina e Caribe (ALC), empréstimos e investimentos vindos da República Popular da China tem financiado uma gama impressionante de projetos de infraestrutura, energia e mineração. Os projetos de energia incluem petróleo, gás, geração e transmissão de energia elétrica, energia renovável e minerais estratégicos. Somando um valor de mais de US$58 bilhões entre 2000 e 2019, esses fundos foram fornecidos por bancos e empresas estatais da China, pela Iniciativa do Cinturão e Rota (ICR) ou Nova Rota da Seda, um programa de investimento internacional de longo prazo. As empresas privadas chinesas, que muitas vezes recebem apoio financeiro do governo, forneceram fundos adicionais. Além dos registros financeiros disponíveis ao público, o governo chinês provavelmente forneceu quantias desconhecidas em financiamento não oficial, para a região. A China é uma peça importante na energia da ALC. De acordo com a base de dados de Financiamento de Energia Global da China da Universidade de Boston, entre 2000 e 2019, o país dedicou US$58,4 bilhões para o setor energético da ALC. Do total, 83% foram para projetos de petróleo e gás natural, 12,8% para hidrelétricas, 2,2% para energia solar, 1,5% para “Indeterminado” e menos de 1% para carvão, energia eólica e biomassa, combinados. Os projetos de energia da ICR fizeram parte do total entre 2017 e 2019, com 56% dos gastos da ICR indo para petróleo e gás e 39% para fontes renováveis.

Mas existem riscos potenciais. O impacto de longo prazo do financiamento do governo chinês para as nações latino-americanas está longe de ser transparente. Qual é o custo real da dívida criada pelos projetos de energia em toda a região e quais as resultantes questões sociais, trabalhistas, ambientais e de governança? Os níveis reais da dívida são desconhecidos, já que a China muitas vezes não revela os detalhes de seus acordos de financiamento. A China normalmente exige que os projetos que recebem financiamento chinês comprem exclusivamente materiais e equipamentos feitos na China, usem serviços profissionais e funcionários chineses, criando atrito com os fabricantes e trabalhadores regionais. A superpotência asiática tem tido um grande sucesso na expansão da sua presença nos setores de energia, mineração, comercio, entre outros, na ALC fornecendo uma grande quantidade de empréstimos bonificados, investimentos e outros tipos de financiamento através dos seus bancos estatais, da gigantesca Iniciativa Cinturão e Rota (IC R ) e de empresas chinesas, tanto privadas como estatais. Também fornece aos países desta região algumas das tecnologias mais avançadas do mundo (como sistemas de energia solar e eólica) a preços altamente competitivos. Os créditos e investimentos chineses são geralmente bem recebidos como alternativa às fontes de financiamento privado ou para preencher lacunas orçamentais. Eles foram particularmente bem vindos

em países (como a Venezuela) que possuem acesso limitado a empréstimos comerciais do exterior ou a investimento estrangeiro direto (IED). Na Venezuela, a situação é agravada pelo desejo de evitar as exigências onerosas das instituições financeiras internacionais. Como irá a administração Biden lidar com o desafio da crescente penetração da China nas economias da América Latina e do Caribe e suas frequentes práticas competitivas desiguais?

celulares, laptops e veículos elétricos, assim como pelo setor militar e aeroespacial. A influência chinesa também pode impactar a posição de alguns Estados da ALC em fóruns internacionais, como as Nações Unidas.

De onde vem o dinheiro?

Nas duas últimas décadas, a China se tornou um importante credor global com empréstimos diretos e créditos comerciais de mais de US$1,5 trilhões para mais de 150 países em todo o mundo 2 . Os créditos pendentes da China excedem agora mais de 5% do PIB global 3 . Como consequência, a China se tornou o maior credor oficial do mundo, ultrapassando credores oficiais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), ou todos os governos credores da OCDE combinados. 4 Como a China não é totalmente transparente em relação aos seus empréstimos internacionais, há portanto uma imagem incompleta sobre a quantia que os países de todo o mundo devem à China e em que condições. Na realidade, é provável que o valor total dos empréstimos internacionais da China seja significativamente maior do que as estimativas preveem. 5 Esta falta de transparência da China sobre seus empréstimos internacionais cria um problema de dívida oculta, com consequências

A crescente dependência de alguns países da ALC do financiamento da dívida chinesa, juntamente com um aumento da atividade de F&A, 1 pode comprometer uma possível futura cooperação política e econômica com os Estados Unidos. A crescente influência regional da China pode, com o tempo, colocar em risco o acesso de empresas dos EUA aos ricos depósitos de lítio do Chile, Bolívia e Argentina, um metal estratégico usado nas baterias para telefones

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chineses. A China também financiou a construção de diversos estádios esportivos na ALC como parte de sua diplomacia cultural.

significativas associadas à supervisão internacional, à precificação que põem em risco a soberania e à prioridade de pagamento da dívida emitida por outras instituições financeiras não chinesas. 6 A China financia uma ampla gama de projetos internacionais por meio de duas instituições financeiras estatais gigantes - o Banco de Desenvolvimento da China (CDB) e o Banco de Exportação e Importação da China (CHEXIM) - bem como por meio de seu enorme programa ICR, focado principalmente em projetos de infraestrutura. As empresas privadas chinesas também financiam diretamente projetos no exterior com o apoio não só de entidades financeiras governamentais, mas também de empresas estatais, como a empresa estatal de petróleo da China, a China National Petroleum Company (CNPC). A CNPC é uma empresa internacional de petróleo e gás que opera em mais de 30 países e que em 2019 tinha mais de 460.000 funcionários. A CNPC anunciou reservas de 3,7 bilhões de barris de petróleo e produziu, em 2019, 181 milhões de toneladas métricas de petróleo bruto, de acordo com seu relatório anual. Os beneficiários dos financiamentos chineses - como empresas de energia ou projetos relacionados na ALC - podem receber investimentos diretos ou empréstimos, enquanto

O primeiro-ministro chinês Li Keqiang (L) e a presidente brasileira Dilma Rousseff participaram virtualmente no dia 19 de maio de 2015, em Brasília, Brasil, de uma cerimônia de inauguração do projeto de transmissão de eletricidade de alta tensão para a hidrelétrica de Belo Monte. © Pang Xinglei/ Xinhua/Alamy Live News

governos com moedas problemáticas podem beneficiar da troca monetária com os bancos

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O compromisso energético da China na ALC Nos últimos 20 anos a China expandiu agressivamente seu envolvimento energético na região da ALC. Impulsionada originalmente pela expansão econômica e pela necessidade de matérias- primas, a abordagem da China passou por transformações qualitativas tanto na diplomacia quanto nos seus investimentos. Os chineses, como qualquer bom investidor, querem escolher projetos que gerem lucros ou receitas suficientes para pagar os empréstimos, ao contrário da infeliz experiência de empréstimos em troca de petróleo com a companhia petrolífera nacional da Venezuela, a PDVSA, que lhes deve dezenas de bilhões de dólares.

A China também investe focando no desenvolvimento de novos mercados para produtos chineses, desde usinas de energia solar a veículos elétricos. A sua crescente presença nos setores de energia da ALC desafia a tradicional hegemonia do mercado pelos EUA, apresenta uma concorrência vigorosa – segundo alguns, injusta - aos negócios dos EUA e levanta questões sobre o acesso de outros países, além da China, às fontes atuais e futuras de lítio, um metal estratégico. Também levanta questões para as nações beneficiárias, como a possibilidade de endividamento excessivo, corrupção, danos ambientais, questões trabalhistas e ressentimento de fabricantes locais, que muitas vezes são excluídos do fornecimento de bens e serviços para projetos multibilionários. A política isolacionista do presidente Trump acabou criando novas oportunidades para a China na ALC. A medida que o anterior governo se concentrou em “Tornar a América (EUA) grandiosa novamente” e impôs taxas de importação sobre produtos chineses como parte de sua guerra comercial com Pequim, a China foi duplicando o seu ritmo de investimentos estratégicos na ALC, buscando novos projetos de infraestrutura, telecomunicações, mineração e energia - especialmente de energias renováveis - por toda a região.

O crescimento dos mercados de mobilidade eléctrica e do armazenamento de energia aumenta a procura de matérias- primas utilizadas em baterias de iões de lítio

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de Financiamento de Energia Global da China da Universidade de Boston. Embora Pequim claramente não dependa da ALC como fonte principal de petróleo, o seu interesse em projetos de energia renovável é elétrico: a ALC é um mercado em expansão para painéis solares, turbinas eólicas, baterias e veículos elétricos de fabricação chinesa. Nas últimas décadas, a China emergiu como a principal força nos setores chave da energia renovável: tornou-se o maior produtor, exportador e instalador mundial de painéis solares (fotovoltaicos ou FV), turbinas eólicas, baterias e veículos elétricos. 7 À medida que se foi desenrolando uma guerra de preços internacional entre os fabricantes de células solares, os produtores chineses de painéis solares lutavam com as rígidas taxas de “antidumping” na Europa e nos EUA, que eram os seus principais mercados de exportação. Os fabricantes de torres eólicas também enfrentaram altas taxas. Mas os fabricantes chineses descobriram que novos mercados - livres das taxas de “antidumping” – foram abertos na ALC para todos os materiais utilizados em projetos solares e eólicos. Embora muitos dos empreendedores de projetos de energia solar e eólica que ganharam licitações na América Latina sejam europeus, todos os equipamentos utilizados por eles são equipamentos

China-América Latina: um grande impulso na energia renovável e na transmissão de energia elétrica O uso de energia da China evoluiu ao longo da trajetória do seu desenvolvimento econômico moderno. No caso dos combustíveis fósseis, a China tem simplesmente aceitado os preços e seguido a tecnologia. No entanto, nas energias renováveis modernas, e com a ajuda das inovações apoiadas pelo seu governo, a China está prestes a desempenhar um papel de liderança em esse setor. O histórico do país asiático com relação à energia é inegavelmente misto: é o maior consumidor mundial de carvão e petróleo importado, mas também é o maior consumidor e produtor mundial de tecnologias de energia renovável. Internacionalmente, a China investe, financia e possui ativos em hidrocarbonetos e energia elétrica, projetos de energia renovável e minerais críticos. A presença crescente da China nos mercados de energia da ALC é um desafio claro para os EUA. Dos US$58,4 bilhões de gastos com energia na ALC, no período de 2000-2019, mais de 15% foram para energias renováveis, de acordo com a base de dados

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prejudicado pela falta de linhas de transmissão. Em 2019, a empresa chinesa Southern Power Grid comprou 27,7% das ações da maior empresa de transmissão elétrica do Chile, a Transelec, 8 o que ajudará a ligar as usinas solares a uma rede nacional em expansão.

chineses de baixo custo. Ao fazer isso, eles podem oferecer preços altamente competitivos para contratos de compra de energia (CCEs). As empresas chinesas fornecem os equipamentos e os bancos chineses providenciam o financiamento. Mesmo em países com alto risco cambial, como Argentina e Colômbia, o CDB forneceu o financiamento dos projetos. Na Argentina, por exemplo, em 2019 o CHEXIM financiou 85% do valor de uma usina solar de US$390 milhões. Portanto a América Latina beneficia com a entrada de equipamentos chineses de baixo custo, ajudando países como o México a desenvolver um mercado distribuído sem subsídios. Por exemplo, numa licitação colombiana em 2019, a empresa chinesa Trina, um a d a s maiores fabricantes de módulos solares, ganhou 100% da participação solar da licitação (quase 350 megawatts - MW) a preços recordes, e com contratos de compra de energia avaliados na moeda local. Validar os contratos de compra de energia em pesos colombianos foi um risco que valeu a pena para a fabricante chinesa, que enviará milhões de painéis solares para a Colômbia nos próximos anos. A China também vem aumentando a sua participação em energias renováveis e energia elétrica. Por exemplo, como líder na América Latina quando falamos em projetos solares de grande escala, o Chile viu o seu crescimento na geração de energia solar ser

Da mesma forma, no final de 2020, a empresa chinesa State Grid Corporation (State Grid) se dispôs a pagar o valor de US$3 bilhões para obter controle da Compañia General de Electricidad SA (CGE), uma empresa chilena fundada em 1905, que distribui eletricidade para 2,3 milhões de clientes. 9 Se esta transação obtiver aprovação dos órgãos reguladores, a State Grid controlará 57% da distribuição de energia do Chile. Em junho de 2020, a State Grid também concluiu a compra de 100% das ações da Sempra Energy na

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Chilquinta Energía, a terceira maior fornecedora de energia elétrica do Chile. Como sua primeira ação no México, a subsidiária da chinesa, State Power Investment Corp. (SPIC) adquiriu a Zuma Energía por um valor não divulgado. A Zuma possui parques eólicos e solares, e se auto intitula como a maior produtora de energia renovável do México. A SPIC também possui operações de energia renovável no Brasil e no Chile.

A China assumiu esse compromisso no México apesar da decisão do governo López Obrador de desacelerar novos investimentos privados e estrangeiros em energias renováveis e fortalecer o papel da Comisión Federal de Electricidad (CFE), a empresa estatal de fornecimento elétrico. 10 Os investimentos da State Grid no Brasil totalizam hoje US$12,4 bilhões e incluem a maior empresa privada de energia do Brasil, a CPFL Energia S.A., que está construindo a rede de transmissão da enorme hidrelétrica de Belo Monte. 11 Foi noticiado que a State Grid tenciona investir cerca de US$38 bilhões na infraestrutura de transmissão e geração de energia no Brasil, até 2023. 12 Em 2020, o Brasil representou 60% dos investimentos da State Grid fora da China. 13 A tecnologia chinesa para a transmissão de Ultra High Voltage (Tensão Ultra Alta ou UHV) fornece ao país uma vantagem no que diz respeito a projetos de sistemas energéticos. Essa tecnologia de ponta está sendo utilizada nos principais mercados da América Latina por empresas chinesas como a State Grid. Ela reduz as perdas de energia e pode lidar com fontes de alimentação intermitente vindas de recursos renováveis, mais eficazmente do que os sistemas atuais. Os projetos que instalam o sistema chinês UHV terão que usar tecnologia e equipamentos chineses

Um pedestre passa por uma filial da State Grid Corporation da China na cidade de Yichang, na província de Hubei, no centro da China.

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de Janeiro, pela State Grid, foi a “Estreia” da tecnologia UHV fora da China. Esta linha de transmissão UHVDC de 2.542,7 quilômetros (1.580 milhas) é a mais longa do mundo, de acordo com a Power Technology, passando por 80 cidades em sua rota do Amazonas ao Rio pela costa do sudeste brasileiro. Esse sistema de transmissão gerou enormes vendas de materiais e equipamentos, 14 sendo um excelente exemplo da tecnologia energética chinesa.

em sua construção e operação, assim como técnicos e empregados chineses. Confiante de que as tecnologias de armazenamento e mobilidade elétrica atingirão economias de escala semelhantes às da energia solar e eólica, a China está posicionada para se tornar um importante fornecedor para a ALC. As empresas chinesas já exportam ônibus, bicicletas e carros elétricos para a América do Sul, embora a tecnologia ainda não consiga competir com os meios de transporte convencionais. Mas, ao estarem promovendo a mobilidade elétrica na região, os fabricantes chineses ganham vantagem no mercado local. Apoiada pelo subsídio nacional doméstico da China, a expansão internacional de novas redes e mercados de energia gera benefícios econômicos significativos para as empresas chinesas, que conseguem oferecer no exterior equipamentos de alta qualidade a baixos preços. A State Grid anunciou que o retorno dos seus ativos no exterior superou os dois dígitos, sendo aproximadamente três a cinco vezes mais lucrativos do que investimentos domésticos equivalentes. A tecnologia UHV já é amplamente utilizada na China e o país está procurando aprimorar sua tecnologia UHV para que se torne um padrão global. No Brasil, por exemplo, a construção da linha de transmissão da hidrelétrica de Belo Monte para o Rio

No entanto, esse enorme projeto de infraestrutura - que foi alvo de vários protestos - foi construído à sombra da polêmica hidrelétrica de Belo Monte.

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A construção de Belo Monte - a terceira maior hidrelétrica do mundo - deixou as suas marcas na Amazônia, como foi noticiado pela Associated Press em dezembro de 2019. A barragem deslocou cerca de 40.000 pessoas, deixou trechos totalmente secos ao longo do rio Xingu, levou diversas comunidades pesqueiras à falência, prejudicou as comunidades indígenas e causou inúmeros danos ambientais. China-América Latina e minerais estratégicos A China já é líder na mineração e extração de minerais estratégicos usados em componentes para Em 2017, o Departamento do Interior dos EUA publicou uma lista dos 35 minerais "críticos", incluindo bauxita, cobalto, lítio, estanho e titânio, sendo todos produzidos na América Latina. Os metais de terras raras, uma categoria que inclui 17 metais, estão agrupados na lista do governo em uma única categoria e são essenciais para diversos setores da alta tecnologia. O Brasil produz um pequeno volume de metais de terras raras. tecnologias essenciais, como defesa, telecomunicações e energia renovável.

Por ser um país rico em minerais, a China possui uma vasta experiência na extração de minerais usados em sua industrialização. No entanto, o país está olhando para o exterior para evitar a exploração excessiva dos seus próprios recursos. As maiores empresas chinesas que produzem metais e minerais estratégicos, também estão entre as maiores do mundo e estão se movimentando rapidamente para explorar novas reservas desses recursos na América Latina. Tianqi Lithium e Ganfeng Lithium são duas dessas empresas. O armazenamento de energia e mobilidade elétrica são a próxima fronteira da transição energética. Componentes utilizados em energia solar, eólica e outros equipamentos de energia renovável, especialmente baterias de íon-lítio, precisam de minerais críticos que abundam na região da ALC. De acordo com a Benchmark Minerals Intelligence, em 2020, a China liderou a produção mundial de células de bateria com 63,2% da produção, enquanto os EUA estavam em segundo lugar com apenas 14,2% (Figura 1).

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Dado o atual crescimento da demanda por baterias de íon-lítio, quase todas as matérias-primas usadas na fabricação de baterias extraídas por empresas chinesas no exterior são enviadas para China, para consumo doméstico. Produtos finais, como veículos elétricos chineses, foram enviados para a América Latina para demonstrar seu desempenho e pegada ecológica. Esta é uma parte fundamental dos esforços do país para promover seus produtos no exterior e criação de novos mercados. Ônibus elétricos chineses já foram enviados para Argentina, Chile, Colômbia e Peru. A fabricante chinesa de ônibus elétricos BYD adquiriu uma antiga fábrica de montagem de automóveis da Ford no Brasil. 15 Tendo em conta o tamanho do mercado brasileiro e o crescente apoio do governo aos veículos elétricos, construção de uma fábrica de automóveis no Brasil faz todo o sentido. Esta fabrica também pode servir como base para a penetração em outros mercados regionais. A BYD já possui outras três fábricas operando no Brasil.

Figura 1. Produção global de células de bateria de íon-lítio, 2020. Legenda: ROW = Resto do Mundo

A determinação da China em se tornar o principal fornecedor de tecnologias de energia renovável encorajou as empresas apoiadas pelo estado chinês a fazer grandes investimentos em todas as etapas da cadeia de produção da bateria de íon-lítio, desde a extração, processamento dos minerais, fabricação de componentes, montagem de baterias e exportação do produto final. Nenhum outro país do mundo atingiu tal nível de domínio sobre a cadeia de produção das baterias de íon-lítio (Figura 2).

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Figura 2. Mapa da participação significativa na atual cadeia global de produção das baterias de íon-lítio

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Recentemente, as empresas chinesas investiram bilhões de dólares em empreendimentos de mineração de lítio na América Latina, principalmente na Argentina, Brasil, Chile e Bolívia. Ganfeng Lithium, a maior produtora de compostos de lítio da China e fornecedora de Tesla, entrou em um consorcio, para minerar lítio no estado mexicano de Sonora em 2019. 16 No final do ano passado, Ganfeng exerceu a sua capacidade de aumentar sua participação nas ações no projeto Bacanora Lithium passando de 22,5% a 50%.

E no início de dezembro de 2020, a Ganfeng anunciou que construirá uma planta de reciclagem de baterias de íon-lítio no México. O plano é reciclar as baterias de carros de Tesla nos EUA, assim como baterias de ônibus elétricos chineses usados na América do Sul. 17 Em 2018, a empresa chinesa Tianqi Lithium utilizou US$4,1 bilhões na compra de 24% das ações da SQM, uma produtora chilena de lítio e derivados, que detém uma parte importante das reservas mundiais de lítio. 18 Dado o tamanho dos depósitos de lítio, uma agência de desenvolvimento econômico chilena contestou a venda no tribunal, alegando antitruste por parte da compradora, mas o tribunal aprovou a transação e o projeto está em andamento. Algumas empresas japonesas também têm comprado ações em projetos de lítio no Chile e na Argentina, mas o investimento estratégico da Tianqi promete garantir sua ascensão no mercado de lítio mundial. Apesar das incertezas políticas e econômicas na Argentina, as mineradoras chinesas estão investindo em projetos promissores de lítio e energia solar no país. 19 Um exemplo é a chinesa Ganfeng Lithium que, em 2020, aumentou sua participação acionária para 51% em uma operação de produção de lítio na província de Jujuy, no noroeste da Argentina. O CHEXIM também financiou 85% do projeto solar Cauchari em Jujuy, custando quase US$400 milhões,

Ônibus elétricos da BYD, a maior fabricante de automóveis elétricos da China, estão sendo testados em Bogotá com o objetivo de ajudar a capital da Colômbia a aliviar a poluição do ar. Fonte New China TV

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com uma taxa de juros de 3% ao ano, por um período de 15 anos, segundo a Reuters. A província foi obrigada a comprar quase 80% dos equipamentos da usina solar a fornecedores chineses, como a Huawei Technologies. 20

incerteza política e a pandemia da COVID-19, pode comprometer o projeto ou, no mínimo, causar atrasos. Um outro projeto de lítio, entre a YLB e a empresa alemã ACI Systems, foi cancelado antes do ex- presidente Evo Morales deixar o país em novembro de 2019. 22 Os manifestantes exigiam uma fábrica de baterias e empregos a partir dos investimentos propostos. Os países da ALC com grandes depósitos de lítio estão pressionando para que neles se fabriquem produtos finais, como baterias, além de fornecimento de matéria-prima. Países com fazendas eólicas e usinas solares, dizem que querem ser capazes de fabricar os próprios componentes para novas instalações. Mas as chances de isso acontecer são mínimas: a região não possui uma capacidade de produção local robusta suficiente para responder ao crescente número de projetos solares e eólicos. Ao mesmo tempo, a China deseja obter lítio com o menor custo possível e manter os processos de valor agregado em casa. As empresas chinesas continuarão a vender seus painéis solares e turbinas eólicas na ALC - e no resto do mundo - o mais tempo possível, para manter os empregos na China e obter altas receitas de exportação. Como um especialista norteamericano em mineração e minerais disse em uma entrevista, os recursos de

VER O GRAFICO EM GRANDE >> Estendendo-se pela Argentina, Bolívia e Chile, abriga as maiores reservas de lítio do mundo.

Em 2019, um consórcio chinês ganhou uma licitação para adquirir 49% das ações em um projeto de US$2,4 bilhões para produzir lítio em parceria com a empresa boliviana Yacimientos de Litio Bolivianos (YLB). 21 No entanto, a combinação de agitação social,

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crescente influência comercial da China na América Latina tem implicações para as relações entre os EUA e a ALC. O hemisfério ocidental, em sua maior parte, tem estado alinhado com os Estados Unidos, e os países da ALC consideram os EUA um importante parceiro comercial. No entanto, os investimentos dos EUA na América Latina, particularmente na mineração de minerais essenciais, têm estado dormentes nos últimos anos e os agressivos investidores chineses entraram em ação para preencher esse vácuo. Para combater o domínio da China na cadeia de abastecimento de minerais essenciais, o presidente Trump emitiu uma ordem executiva em 2017 criando uma estratégia que garantiria o abastecimento seguro e confiável de minerais essenciais. O plano inclui recomendações e itens de ação para reduzir a "vulnerabilidade dos Estados Unidos a interrupções no fornecimento de minerais críticos". As ações incluem encontrar maneiras de reduzir ou eliminar o uso de cobalto em baterias de lítio, reciclar e recuperar componentes, melhorar a eficiência da fabricação e promover a mineração sustentável nos Estados Unidos. 23 A estratégia dos EUA também exigia maior cooperação com os países aliados, particularmente com o Canadá e México. Novos investimentos no setor de mineração do hemisfério ocidental, bem como a cooperação com aliados como Europa Ocidental,

lítio dos EUA são muito maiores do que as estimativas publicadas pelo governo e pediu às empresas dos EUA que aumentassem os investimentos na produção doméstica de lítio. “A China tem uma estratégia para investir em lítio, mas nossa visão é limitada”, disse Jesse R. Edmondson, geólogo profissional do Alabama, fundador e CEO da US Critical Minerals, que trabalha com a exploração e desenvolvimento de mineração, e fundador e diretor da Critical Resources Consulting. O grande esforço da China para obter mais ativos de mineração de lítio na ALC "é uma preocupação para os EUA e deve ser uma preocupação para o resto do mundo", disse ele. “Não estou preocupado por não termos material suficiente aqui, mas me preocupa que, se não investirmos no lítio doméstico, poderemos ficar à mercê da indústria chinesa de fabricação de baterias”. A resposta do governo dos EUA ao envolvimento chinês com minerais estratégicos A aposta da China em fortalecer as relações diplomáticas e investimentos financeiros nos países da ALC beneficia o governo chinês, uma vez que se traduzem em empregos, boa vontade regional e novas fontes de minerais essenciais e receita. No entanto, a

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impulsionar o crescimento econômico e atender às necessidades do crescimento populacional. No início, América Crece focava principalmente na infraestrutura do setor de energia. No entanto, como os investimentos da China na região - incluindo as despesas da ICR - cobrem infraestrutura energética, telecomunicações, portos, rodovias e aeroportos, Como resultado a América Crece passou a cobrir também essas áreas, com ênfase em infraestrutura energética. Segundo o Departamento de Estado dos EUA, a América Crece terá como foco inicial a América Central, correndo o risco de perder oportunidades em outras áreas como a América do Sul, onde a China é muito ativa.

Japão e Coréia do Sul, fazem parte do esforço para contrabalançar o papel dominante da China em minerais críticos. Em 2019, o Departamento de Estado dos EUA criou a Iniciativa de Governança de Recursos Energéticos para ajudar os países aliados a extrair minerais essenciais de forma sustentável. 24 O Peru é um parceiro fundador da iniciativa e a Argentina e o Brasil são participantes. O programa promove a mineração sustentável por meio de um plano e um kit de ferramentas que inclui as melhores práticas e lições aprendidas. Outra iniciativa dos EUA é a “América Crece” (América Cresce), que foi oficialmente lançada em setembro de 2020. 25 América Crece é “uma abordagem inovadora que engloba todo o governo, para apoiar o desenvolvimento econômico catalisando o investimento do setor privado em energia e outros projetos de infraestrutura na América Latina e o Caribe,” 26 segundo o Departamento de Estado dos EUA. Seu objetivo é apoiar o desenvolvimento econômico por meio da criação de empregos e projetos de infraestrutura na região da ALC. A iniciativa foi desenvolvida depois do governo dos EUA perceber que a ALC sofre de uma grande escassez de investimentos em infraestrutura. A região precisa de entre US$100 bilhões a US$150 bilhões em novos investimentos anuais em infraestrutura para ajudar a

O governo Biden e as relações China-ALC: o que fazer? O governo Biden terá que lidar com uma ALC devastada pela COVID-19, com seus países

enfrentando a maior contração econômica de sua história moderna. O FMI está prevendo uma contração geral do PIB de 8,1% em 2020 e uma recuperação de 3,6% em 2021. Mas se espera que a maioria das economias não retorne ao crescimento pré-pandemia até 2023. 27

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Caribe, para onde viajou mais de uma dúzia de vezes e prestou especial atenção aos seus problemas. O plano hemisférico do governo Biden será concentrado na expansão da ajuda externa, mobilização/facilitação do investimento privado, combate à corrupção e redução da pobreza, dando especial atenção às mulheres da região. 29 Isso apresenta uma oportunidade única para o novo governo encorajar uma maior cooperação regional na ALC com estreita colaboração entre seus aliados democráticos tradicionais (incluindo Canadá, Japão, UE e Reino Unido) nessas e em outras questões como um contrapeso estratégico à China. Biden também planeja enviar ajuda para países como Honduras, Guatemala e El Salvador - o Triângulo Norte - em um esforço para diminuir a pobreza e a violência que incentivam a migração. Mais uma vez, esses desafios serão enfrentados de forma mais eficaz por meio da expansão do multilateralismo e de maior cooperação regional com o vizinho México. Quanto ao futuro envolvimento energético de Biden na América Latina, recordando as políticas da era Obama, parece haver uma forte inclinação para apoiar maiores investimentos em energias renováveis. Biden também sinalizou que seu governo entrará novamente no Acordo de Paris assim que possível e provavelmente convocará a cúpula climática global

Em 2019, o comércio entre a China e a América Latina cresceu 19%, para US$307,4 bilhões, segundo Fitch Solutions. A China é o segundo maior parceiro comercial da América Latina, depois dos EUA. Embora ainda não totalmente definidas, as futuras políticas do novo governo Biden sobre o envolvimento na América Latina e a abrangência do papel da China provavelmente reverterão de muitas maneiras ao que podemos descrever como o “status quo de Obama”, que enfatizou as políticas de multilateralismo e aprimorou o comércio internacional. 28 Também vale a pena mencionar que, durante os seus oito anos como vice-presidente, Biden foi o enviado diplomático especial do governo Obama para a América Latina e o

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nos primeiros 100 dias do seu governo. 30 Biden comprometerá novamente os Estados Unidos na batalha contra as mudanças climáticas, conforme ressaltado por suas nomeações para o gabinete, particularmente a de John Kerry, como o primeiro enviado presidencial especial do clima. O enfoque climático pode se traduzir em um engajamento direto e específico com o Brasil, especialmente sobre o desmatamento na Amazônia. 31 Como possível contrapeso à China, Biden propõe uma estratégia de investimento como parte de seu atual plano climático. Este projeto enfatiza “energia limpa e infraestrutura resiliente e sustentável” que subsequentemente irá “impulsionar uma onda de inovação que nos ajudará a alcançar o objetivo de um hemisfério seguro, de classe média e democrático, do Canadá ao Chile” . 32 O seu compromisso nesta estratégia inclui o apoio a redes de energia bem integradas do México à América Central e até à Colômbia, com energia gerada por fontes de limpas. Além disso, Biden incentiva transições para energia limpa e adaptações às mudanças climáticas para regiões que estão passando por condições e padrões climáticos severos, como o Caribe e o Triângulo Norte. 33 Esses planos, embora ambiciosos, são alcançáveis com ajuda e estimulo de um maior investimento do setor privado dos EUA na região.

O governo Biden também usará a Iniciativa de Exportação de Energia Limpa e Investimento Climático, que fornece financiamento de baixo custo para pequenas nações insulares no Pacífico e no Caribe que são potenciais líderes no combate à crise climática. 34 Em relação ao envolvimento direto com a China, Biden tentará "formar uma frente única" para manter a China "responsável por ter altos padrões ambientais em seus projetos de infraestrutura da ICR, para que a China não possa terceirizar a poluição para outros países". 35 Ações mais concretas incluem a construção de acordos bilaterais EUA-China sobre a mitigação da emissão de carbono, promovendo o compromisso do G20 de “acabar com todos os subsídios de financiamento de exportação de projetos de alta emissão de carbono”, apresentando aos países envolvidos com a ICR com fontes alternativas de financiamento de desenvolvimento para “investimentos de baixa emissão de carbono ” e “reformas nos padrões do Fundo Monetário Internacional e do banco de desenvolvimento regional sobre as prioridades de pagamento das dívidas para projetos de desenvolvimento”. O objetivo é aumentar os custos e riscos dos projetos que geram altas emissões de carbono e grandes endividamentos. 36 Mais perto de casa, a administração Biden estaria bastante apta para promover uma economia norte-

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americana mais competitiva, trabalhando em estreita colaboração com seus parceiros da USMCA, Canadá e México. No setor energético, os governos dos EUA, Canadá e México devem trabalhar juntos para reavivar a Parceria Norte-Americana do Clima, Energia Limpa e Meio Ambiente lançada em 2016 37 e uma estratégia norte-americana atualizada para o avanço das tecnologias de energia renovável e de baixa emissão de carbono. Isso deve incluir esforços para expandir o nível de comércio internacional de eletricidade e investimentos em infraestrutura. Uma cooperação transfronteiriça mais estreita na transmissão elétrica é necessária não apenas para promover maior segurança energética, mas também para planejar contra ameaças potencialmente catastróficas, que vão desde falhas de sistema a ataques cibernéticos. 38 Investimentos chineses em petróleo e gás na ALC Sabe-se que Pequim costuma olhar além das suas fronteiras para investir na exploração e produção de petróleo, em grande parte para satisfazer sua crescente demanda doméstica por energia. A demanda por petróleo cresceu claramente desde as reformas econômicas do país em 1978 e sua abertura à comunidade internacional e ao investimento estrangeiro. A "estratégia de saída" de Pequim apenas

acelerou quando a China se tornou o maior consumidor de energia do mundo em 2010.

Nas últimas duas décadas, Rússia, Ásia Central, Oriente Médio, África e América Latina forneceram petróleo à China. Mas além de sua necessidade de satisfazer a demanda doméstica, a China - desde 2017, o maior importador mundial de petróleo bruto - também tem investido em projetos petroleiros no exterior para mitigar sua vulnerabilidade aos preços tumultuosos do petróleo e para reduzir sua dependência de suprimentos regionais instáveis. 39 Em suma, Pequim tem feito um esforço concentrado para reforçar a segurança energética e a diversificação de abastecimentos e fontes. A China utiliza empréstimos em troca de petróleo para satisfazer a sua procura interna de energia e garantir o reembolso da dívida.

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A China utiliza acordos de empréstimo em troca de petróleo em países produtores de petróleo, apostando que a produção de petróleo desses países garantirá o pagamento da dívida. Em 2009, a China assinou um programa de empréstimo em troca de petróleo de longo prazo por US$10 bilhões com a Petrobras do Brasil para garantir um fornecimento de 200.000 barris de petróleo bruto por dia (b/d). Desde então, a Petrobras fez outros acordos, como o pré-pagamento de alguns empréstimos multibilionários com o CDB, liberando-a da obrigação de fornecimento preferencial de 100.000 b/d de petróleo bruto equivalente. 40 Atualmente, o Brasil é o principal fornecedor latino- americano de petróleo bruto da China, seguido da Colômbia e da Venezuela. Em 2019, o Brasil enviou 803.000 b/d para a China, a Colômbia 262.000 b/d e a Venezuela 228.000 b/d, de acordo com a Administração de Informação de Energia dos EUA (EIA). A China, em 2019, importou uma média de 10,1 milhões de b/d de petróleo bruto, um aumento de cerca de 9% em relação a 2018, informou a EIA. A China tem investido em uma ampla gama de projetos brasileiros de exploração de petróleo e gás, assim como em consórcios na construção de oleodutos e infraestrutura para a produção de petróleo. 41 Por exemplo, a CNPC e a CNOOC fazem parte de um projeto de petróleo de alto nível internacional no Brasil. Cada uma detém uma

A CNPC fez seu primeiro investimento no exterior e o primeiro na América Latina em 1993, de acordo com a empresa. Naquele ano, a CNPC ganhou a licitação para desenvolver um bloco do campo petrolífero de Talara, no Peru, um campo marginal que estava em produção há mais de 100 anos, com a maioria de seus poços fechados. Com sucesso em seu primeiro esforço, a CNPC desenvolveu outro bloco no Peru, passando mais tarde a fazer investimentos de bilhões de dólares e empréstimos para projetos de petróleo em toda a América Latina, principalmente na América do Sul. Para além da CNPC, três outros gigantes estatais de energia operam na ALC: China National Offshore Oil Corp. (CNOOC), China Petroleum and Chemical Corp. (SINOPEC) e SINOCHEM, que trabalha com produtos químicos, fertilizantes e petróleo. BRASIL: Os investimentos da China no Brasil até o momento já atingiram US$38,9 bilhões, ou 80,5% do total investido em projetos de petróleo na ALC. A CBD negocia com as estatais brasileiras - especialmente com a Petrobras (Petróleo Brasileiro S.A.) - buscando alinhar seus empréstimos com as prioridades econômicas do governo brasileiro, como apoiar as indústrias nacionais que trabalham na área de petróleo e construir cadeias de abastecimento locais para a indústria do petróleo.

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participação de 10% no consórcio que está desenvolvendo Libra, o campo petroleiro do pré-sal de águas profundas, estimado em 8-12 bilhões de barris em reservas recuperáveis.

chefiada pelo presidente de esquerda Hugo Chávez. O acordo inaugurou um período de um novo comércio bilateral, investimentos chineses e grandes empréstimos nos setores de petróleo, mineração, infraestrutura e outras áreas. Ambos eram países socialistas e ambos tinham economias complementares. A China precisava (e ainda precisa) de petróleo importado, e a Venezuela - que antes tinha uma das Companhias Nacionais de Petróleo (PDVSA) mais eficientes do mundo - possui as maiores reservas comprovadas de petróleo do mundo. Por volta de 2007, o CDB assinou acordos de empréstimo em troca de petróleo com o presidente venezuelano Hugo Chávez e a PDVSA. Mas sob o governo Chávez (que assumiu o cargo em 1999) e o governo do presidente Nicolás Maduro, que assumiu depois da morte de Chávez em 2013, a indústria petrolífera da Venezuela entrou em desordem, tornando-se um centro de ineficiência e corrupção para funcionários do governo e seus amigos. O governo Chávez demitiu executivos competentes da PDVSA, politizou a empresa, não fez investimentos em manutenção e presidiu ao desmantelamento de uma empresa internacional, que era eficiente e lucrativa. Como resultado da má gestão, manutenção deficiente e cortes periódicos de energia nacional, a produção de petróleo da Venezuela caiu de 3,5 milhões b/d em 2000, para 929.000 b/d em 2019. A OPEP informou

Entrada para a sede da PDVSA em Carcacas. Fotografia: Wilfredor

VENEZUELA: A China tinha grandes esperanças quando assinou uma “parceria de desenvolvimento estratégico” em 2001 com a Venezuela, então

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que a produção de petróleo venezuelana foi em média 340.000 b/d em agosto 2020. A Venezuela começou a atrasar as suas entregas de petróleo e pagamentos de empréstimos à China, pois a PDVSA entrou em declínio e a produção despencou.

venezuelano tinha negociado com a China um período de carência para US$19 bilhões em dívidas, que terminaria no final do ano. 43 De fato, nos últimos 20 anos, os países da ALC tem contribuído cada vez mais para as importações de petróleo da China, crescendo de 2% em 2005 para mais de 13% em 2008. 44 Mas, apesar das preocupações internas da China com a segurança energética, o papel da ALC como fornecedor de petróleo é pequeno. Mesmo depois de mais de duas décadas de operações chinesas na região, a América Latina fornece menos de 10% de todo o petróleo importado pela China e apenas uma pequena fração das importações de seu carvão e gás natural. 45 Uma razão para isso é o alto custo do transporte de petróleo bruto da América Latina para a China continental. A principal fonte de petróleo importado pela China é marítima, principalmente o do Médio Oriente. Portanto, e seria provavelmente mais preciso descrever os investimentos de Pequim na exploração e produção de petróleo na ALC como um meio de diversificar o seu fornecimento de petróleo, explorar e entrar em novos mercados e fazer parcerias com empresas estrangeiras, o que pode abrir portas para novas tecnologias e novos negócios nos setores de gás e petrolífero.

O governo Trump começou a aplicar um número crescente de sanções à Venezuela durante vários anos e em 2019, interrompeu a capacidade da PDVSA de exportar petróleo diretamente para a China. Somente em dezembro de 2020 a Venezuela retomou os embarques diretos de petróleo bruto para os chineses. 42 Desde 2007, o CDB e o CHEXIM emprestaram à Venezuela US$62,2 bilhões, de acordo com números do Diálogo Interamericano e da Iniciativa China Global do Centro de Políticas de Desenvolvimento Global da Universidade de Boston. Cerca de US$50 bilhões desse total, supostamente, se refere a dívidas de contratos de petróleo em troca de empréstimos. A Reuters informou em agosto de 2020 que o governo

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